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RECORDANDO E CELEBRANDO A VIDA E A OBRA DE RUBEM ALVES
Ano 10 - Nº 29/30
Outubro de 2015
Publicação Virtual de KOINONIA (ISSN 1981-1810)
_Editorial
 

Rubem Alves precisa ser lembrado e celebrado...” me escreveu Leonardo Boff.  Esta edição de Tempo & Presença reúne um pequeno conjunto de textos sobre a vida e a obra de Rubem Alves. Foram   escritos por alguns amigos, ex-alunos e discípulos que tiveram o privilégio de conviver, por diversos caminhos e de diferentes maneiras, com este cativante e sedutor “contador de estórias” da vida, da sua e da de todos nós...
Rubem Alves é o filho rejeitado do protestantismo brasileiro e,  ao mesmo tempo, ou talvez, por isso mesmo, o maior vindicador da herança teológico-humanista da tradição protestante, infelizmente, ainda, desconhecida ou abandonada por aqueles e aquelas que pretensamente, se consideram seus herdeiros e defensores.

Teólogo com sólida formação acadêmica e pastor profundamente preocupado e envolvido com a vida concreta  daquelas e daqueles colocados sob seu múnus  pastoral -- e nem tanto com as querelas doutrinário-burocráticas que consumiam as energias da igreja da qual fazia parte -- este “protestante obstinado”, como um dia se autoproclamou, viu seu  ministério ser tragado nas ondas da intriga e da delação que  assolaram a Igreja Presbiteriana do Brasil a partir dos anos sessenta.

Engajado numa proposta de renovação das estruturas eclesiásticas para torna-las  instrumentos de humanização da sociedade brasileira que se debatia entre a manutenção de um status quo opressivo, secularmente estabelecido e os empenhos de transformação protagonizados pelos setores mais conscientes e organizados do mundo do trabalho, Rubem Alves deu continuidade ao seu ministério fora dos limites institucionais eclesiásticos ao juntar-se aos empenhos ecumênicos que então ganhavam expressão no Brasil e na América Latina.

Juntou-se aos companheiros/as de outras denominações nos esforços do Setor de Responsabilidade Social da Igreja, da Confederação Evangélica do Brasil (CEB), assessorando seu diretor Waldo Cesar. Participou da organização de vários encontros nacionais sendo o mais destacado a “Conferência do Nordeste”. Esse departamento da CEB tornou-se a expressão nacional de ISAL (Junta Latino-americana de Igreja e Sociedade)  da qual, pouco depois, tornou-se seu Secretário de Estudos. A revista “Cristianismo y Sociedad”, periódico desse organismo passou então a veicular suas reflexões teológicas que foram, pouco a pouco, estruturando seu pensamento, processo este que vai culminar em sua tese de doutoramento na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos em 1968 sob título inédito de “Toward a Theology of Liberation”  (“Para uma Teologia da Libertação”) e fazendo dele o pioneiro dessa escola teológica latino-americana.

De volta ao Brasil, deu prosseguimento a seu compromisso ecumênico acompanhando os empenhos do Centro Ecumênico de Informação (CEI)  que, mais tarde (em 1974), transformou-se no Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI), de cuja Diretoria  foi membro  até sua dissolução em 1994. A partir de 1981 manteve, por cerca de 15 anos, uma coluna permanente na revista Tempo & Presença, principal instrumento de comunicação/reflexão do CEDI e, posteriormente, de “KOINONIA – Presença Ecumênica e Serviço”,  alimentando e fundamentando teológica, lúdica e poeticamente,  o trabalho de ambas entidades ecumênicas junto aos movimentos sociais e às atividades das pastorais populares das igrejas.

Presença permanente nos encontros do Programa de Pastoral do CEDI, Rubem emprestava a essas reuniões uma profunda dimensão eclesial, pois dizia estar se reunindo com sua comunidade de fé. Nessas ocasiões sempre presidia os momentos eucarísticos com suas inovadoras e cativantes liturgias.

Pastor sem igreja e teólogo afastado do mundo acadêmico, Rubem foi também pioneiro ao inaugurar entre nós o diálogo necessário, mas sempre postergado, entre a teologia e a literatura. Exímio artífice da palavra, tanto escrita quanto falada, soube como ninguém reescrever o discurso evangélico sem o ranço secular do religiosismo que segrega e asfixia o “messianismo humanista” presente na mensagem do homem de Nazaré, em suas crônicas simples, diretas e profundas sobre a vida com seus abismos e labirintos, suas vertigens e suas belezas.

Com esta edição de Tempo & Presença, que oferecemos aos nossos leitores e leitoras, queremos homenagear, lembrar e celebrar a vida encantada de RUBEM ALVES, nosso irmão e mestre maior que, mesmo encantado, continua a nos desafiar a descobrir  a presença e a beleza do indizível e inexprimível da vida nos fragmentos de nossas existências.

 
Publicado em: 22/10/2015