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RECORDANDO E CELEBRANDO A VIDA E A OBRA DE RUBEM ALVES
Ano 10 - Nº 29/30
Outubro de 2015
Publicação Virtual de KOINONIA (ISSN 1981-1810)
_Artigo
 
Rubem Alves – 0 ‘cor inquietum’
Por: Leonardo Boff
Data: 22/10/2015

"O que sempre admirei em Rubem Alves foi sua imensa versatilidade de pensamento. Passava da sociologia para a poesia, da poesia para a psicanálise, da psicanálise para a educação e da educação para a teologia. Era um buscador perene, do tipo de Santo Agostinho do "cor  inquietum". Como percebia o mistério de todas as coisas, sabia valorizar cada raio de intelecção e ao mesmo tempo relativizar e sempre celebrar.

Três livros me marcaram muito: o livro sobre a esperança ( “Da Esperança”) que é um texto de alta crítica ao percurso e às ilusões da modernidade, abrindo caminho para uma libertação concreta que, na verdade, deu origem à teologia da libertação (o título original em inglês era sobre a libertação). O segundo foi sobre “Protestantismo e Repressão”, pois me ajudou a entender a lógica do poder da minha Igreja, a católica. Ele mostra que sempre que uma instituição levanta a pretensão de ser a portadora de uma verdade absoluta é condenada a ser fundamentalista e repressiva. Onde há excesso de poder, aí morre o amor e desaparece a misericórdia. O terceiro foi “O Enigma da Religião”. Creio que é um dos melhores textos mundiais, pois soube enfrentar a crítica dos modernos e mostrar o seu equívoco, o de terem colocado a religião no âmbito da razão quando o seu lugar é no  pathos, no sentimento profundo, no utópico. Ela não está ai para explicar o mundo mas para ser um protesto contra este tipo de mundo que pode ser descrito e explicado pela ciência. Ela é a voz de uma consciência que não pode encontrar descanso no mundo, tal como ele é, e que tem como seu projeto utópico transcendê-lo. O que interessava a Rubem não era propriamente a religião mas a dimensão religiosa do homem que o faz projetar sonhos, utopias e poesia. 

Famosa ficou sua frase: "Teologia não é coisa de quem acredita em Deus mas de quem tem saudades de Deus". E Rubem tinha infinita saudade de Deus e das celebrações de sua igreja, da qual foi excluído, mas que para ele, sempre ficou em seu coração. Aqui aparece o seu momento agostiniano: "Tarde te amei, ó beleza, tão antiga e tão nova. Tarde te amei… Meu coração inquieto não descansa enquanto não repousar em ti". Estimo que esta experiência foi a mais profunda da vida de Rubem Alves. 

Ele nos inspira a fazer uma teologia, liberada dos dogmas para ser plenamente sensível ao Deus que se dá no mistério das coisas, num grão de areia, numa pétala de flor. Enfim, se abre a Deus que não  está em nenhum lugar, porque está em todos os lugares e aí sempre pode ser encontrado ou sempre Ele nos encontrará".

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*Teólogo e  filósofo. Escritor com dezenas de livros publicados. Um dos principais articuladores da Teologia da Libertação. Prof. aposentado da UERJ (R io de Janeiro).